“Minha sentença não foi corajosa, mas teve senso prático para entender como transformar os anos de processo em algo útil para a viúva e, também, para a sociedade”.
Com estas palavras, o desembargador federal Cândido Alfredo Silva Leal Júnior do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) iniciou a palestra sobre a sentença proferida em 2000, quando era juiz na 5ª Vara Federal de Porto Alegre.
Segundo o magistrado, a decisão que condenou a União a indenizar por danos morais e materiais a viúva do sargento do Exército Manoel Raymundo Soares foi a de maior carga emotiva da carreira dele.
O militar era preso político na época da Ditadura.
Leal Júnior palestrou sobre a estrutura do processo e da sentença na ação de indenização no Seminário Anos de Chumbo – As Estruturas da Repressão Política em Porto Alegre.
A ação foi interposta pela viúva do preso político na década de 1960, Elisabeth Challup Soares.
O evento aconteceu nesta tarde (30/8/2012), no Plenário Bento Gonçalves do Memorial do Legislativo do Rio Grande do Sul, na capital gaúcha, e foi promovido pelo Movimento de Justiça e Direitos Humanos, Memorial do Judiciário, Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul e pela Comissão de Cidadania e Direitos Humanos da Assembléia.
O seminário fez um resgate histórico do caso e de como o Poder Judiciário tratou o processo de Soares, encontrado morto em 24 de agosto de 1966, no Rio Jacuí, com as mãos amarradas para trás.
O fato, que completou 45 anos, ficou conhecido como “Caso das Mãos Amarradas”, e teve grande repercussão na época, mas não teve culpados responsabilizados pelo Poder Judiciário Estadual.
O magistrado do TRF4 lembrou que coube a ele, na época com 30 anos, julgar uma ação de indenização ajuizada em 1973, que envolvia uma história que aconteceu quando ele nem era nascido, o que exigiu uma pesquisa histórica dos fatos trazidos ao Judiciário.
“Ao proferir a sentença, tive que optar entre apurar os culpados ou agilizar a reparação para a viúva, porque se eu fosse buscar responsabilidades, talvez ela nem recebesse em vida este dinheiro”, conta Leal Júnior.
Cartas de amor no processo
Para embasar a sentença, o desembargador lembra que também contou com as cartas que o sargento do Exército escrevia do cárcere da Ilha do Presídio, no Rio Guaíba, em Porto Alegre, para a esposa, chamada carinhosamente de “Betinha”.
“As quatro cartas fazem parte do eixo sentimental da sentença, assim como a certidão de óbito de Manoel, porque demonstram o contraste paradoxal entre amor e morte”.
Para Leal Júnior, os documentos foram fundamentais para marcar no processo a extensão do dano que a morte do marido causou à viúva, porque deixaram claro como era a vida dela antes e depois da morte do sargento.
Leal Júnior ressaltou também que o relatório da CPI da Assembleia Legislativa gaúcha sobre o caso, feito em 1967, as peças do inquérito policial e principalmente o “Relatório Tovo”, realizado pelo então promotor de Justiça do estado do Rio Grande do Sul, Paulo Cláudio Tovo, foram fundamentais para a sentença.
Segundo ele, a demora no julgamento do processo – quase 30 anos – se deve a vários incidentes jurídicos, como conflitos de competência entre as Justiças Estadual e Federal e questionamentos de prescrição. Em setembro de 2005, a 3ª Turma do TRF4 confirmou a sentença proferida por Leal Júnior.
A juíza federal Vânia Hack de Almeida, à época convocada para atuar na Turma, negou o recurso interposto pela União e manteve a indenização concedida em primeira instância.
Fonte: Site da Justiça Federal do RS, Imprensa TRF4.
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