sábado, 1 de setembro de 2012

Sentença da Justiça Federal gaúcha no caso “Mãos Amarradas”



“Minha sentença não foi corajosa, mas teve senso prático para entender como transformar os anos de processo em algo útil para a viúva e, também, para a sociedade”. 

Com estas palavras, o desembargador federal Cândido Alfredo Silva Leal Júnior do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) iniciou a palestra sobre a sentença proferida em 2000, quando era juiz na 5ª Vara Federal de Porto Alegre. 

Segundo o magistrado, a decisão que condenou a União a indenizar por danos morais e materiais a viúva do sargento do Exército Manoel Raymundo Soares foi a de maior carga emotiva da carreira dele. 

O militar era preso político na época da Ditadura. 

Leal Júnior palestrou sobre a estrutura do processo e da sentença na ação de indenização no Seminário Anos de Chumbo – As Estruturas da Repressão Política em Porto Alegre. 

A ação foi interposta pela viúva do preso político na década de 1960, Elisabeth Challup Soares.

O evento aconteceu nesta tarde (30/8/2012), no Plenário Bento Gonçalves do Memorial do Legislativo do Rio Grande do Sul, na capital gaúcha, e foi promovido pelo Movimento de Justiça e Direitos Humanos, Memorial do Judiciário, Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul e pela Comissão de Cidadania e Direitos Humanos da Assembléia. 

O seminário fez um resgate histórico do caso e de como o Poder Judiciário tratou o processo de Soares, encontrado morto em 24 de agosto de 1966, no Rio Jacuí, com as mãos amarradas para trás. 

O fato, que completou 45 anos, ficou conhecido como “Caso das Mãos Amarradas”, e teve grande repercussão na época, mas não teve culpados responsabilizados pelo Poder Judiciário Estadual. 

O magistrado do TRF4 lembrou que coube a ele, na época com 30 anos, julgar uma ação de indenização ajuizada em 1973, que envolvia uma história que aconteceu quando ele nem era nascido, o que exigiu uma pesquisa histórica dos fatos trazidos ao Judiciário. 

“Ao proferir a sentença, tive que optar entre apurar os culpados ou agilizar a reparação para a viúva, porque se eu fosse buscar responsabilidades, talvez ela nem recebesse em vida este dinheiro”, conta Leal Júnior. 

Cartas de amor no processo 

Para embasar a sentença, o desembargador lembra que também contou com as cartas que o sargento do Exército escrevia do cárcere da Ilha do Presídio, no Rio Guaíba, em Porto Alegre, para a esposa, chamada carinhosamente de “Betinha”. 

“As quatro cartas fazem parte do eixo sentimental da sentença, assim como a certidão de óbito de Manoel, porque demonstram o contraste paradoxal entre amor e morte”. 


Para Leal Júnior, os documentos foram fundamentais para marcar no processo a extensão do dano que a morte do marido causou à viúva, porque deixaram claro como era a vida dela antes e depois da morte do sargento. 

Leal Júnior ressaltou também que o relatório da CPI da Assembleia Legislativa gaúcha sobre o caso, feito em 1967, as peças do inquérito policial e principalmente o “Relatório Tovo”, realizado pelo então promotor de Justiça do estado do Rio Grande do Sul, Paulo Cláudio Tovo, foram fundamentais para a sentença. 

Segundo ele, a demora no julgamento do processo – quase 30 anos – se deve a vários incidentes jurídicos, como conflitos de competência entre as Justiças Estadual e Federal e questionamentos de prescrição. Em setembro de 2005, a 3ª Turma do TRF4 confirmou a sentença proferida por Leal Júnior. 

A juíza federal Vânia Hack de Almeida, à época convocada para atuar na Turma, negou o recurso interposto pela União e manteve a indenização concedida em primeira instância.


Fonte: Site da Justiça Federal do RS,  Imprensa TRF4. 

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